As cidades têm lugares
marcantes: pode ser uma praça, um lago, um bosque, uma construção
antiga, um grande arranha-céu ou, então, um bar. Em Anápolis, este
lugar especial se chamava Pirraça. O bar funcionou por
mais de 20 anos na esquina
da Praça Dom Emanuel, no Bairro Jundiaí, tendo à frente o Seu
Ronaldo, Dona Beth e os filhos: Ronaldo, Rogério, Renato e Lílian.
Foram mais de duas décadas, muitas amizades e histórias.
O Pirraça tinha um charme: as
árvores que faziam sombra na parte da frente onde ficam as mesas,
dentro de uma espécie de cercadinho. Havia um
é de caju, um de abacate e uma mangueira frondosa. Vez
por outra, o abacateiro e
o pé de manga “presenteavam”
os fregueses com as frutas que despencavam lá de cima. Por sorte,
ninguém nunca se machucou. Ainda bem que não tinha jaca.
Mas, o Pirraça tinha também
algumas figuras ímpares, como os garçons Itamar e Baiano. O
primeiro com uma cara mais séria, e o baiano, mais sorridente e
experiente e que, segundo alguns, gostava de esticar a orelha para
ouvir um pouco de conversa alheia e
de fazer piadinhas. Um
gentleman, na sua simplicidade.
O Pirraça tinha também aqueles
fregueses bem peculiares, que se sentavam à mesma mesa e faziam,
sempre, os mesmos pedidos. Os casais de namorados que chegavam quando
o bar já estava quase fechando. Ficavam por ali nuns amassos, pediam
uma cerveja e deixavam o tempo rolar. Era preciso, nesses casos, usar
a tática de encostar as mesas para dar um “desconfiômetro”.
Afinal, a madrugada trazia consigo o cansaço.
Quem está do outro lado não vê
o trabalho que é manter uma estrutura como um bar. Muita coisa
começa a ser feita bem cedo para que a noite tudo esteja pronto para
os clientes. Dona Beth que o diga com o preparo dos tira-gostos,
aliás, uma marca registrada no Pirraça, assim como o choppe da
Brahma, tirado bem gelado e com colarinho em tulipas personalizadas
da marca.
Outra coisa legal é que o
Pirraça ficava na região do “agito” da cidade. Carros e motos
iam e vinham o tempo todo fazendo voltas na Praça Dom Emanuel. Tinha
a turma que gostava de dar cavalo-de-pau com
os veículos; os
motoqueiros que, de vez em quando, colocavam as garotas para andar de
topless na garupa com capacete. O que,
aliás,
gerava grande alvoroço. Muita gente ia para a porta do Pirraça para
sentar na cerca e ver a movimentação. O que dava trabalho para o
Seu Ronaldo. Mas, dentro do bar, era tranquilo e dava para curtir as
tardes de domingo na
cidade.
Eu tive a oportunidade de curtir
o Pirraça, de algumas
formas. Já explico: gostava
de ir no domingo, no final da manhã, quando abria. Ali, dava para
curtir a sombra
das árvores tomando um choppe ou uma cerveja e ler um jornal. À
noite, nos dias de semana, junto com o Ronaldo, o filho mais velho,
tínhamos uma diversão atípica, que era fazer Palavra Cruzada.
Algumas vezes, apostávamos a cerveja da rodada, quem terminasse mais
cedo de completar tudo sem deixar nenhum quadro sem preencher, não
pagava. De qualquer forma,
era sempre muito bom e divertido.
Algumas vezes, rolava algumas
brigas no Pirraça. Uma vez, segundo contam, viram o Pelezinho - que
de vez em quando aparecia tocando a sua guitarra imaginária e
agitando nas mesas -
voando cerca afora. Outra vez, teve uma briga na porta do
estabelecimento. A
confusão foi tanta, que ninguém sabia quem estava do lado de quem
e, pior, qual era o motivo
da briga. Mas, em 20 anos,
nada de grave
ocorreu, por que ali era um ambiente família, uma casa de se
cultivar amizades, algumas
passageiras e, outras, duradouras.
E isso ficou marcado, gravado na história do lugar e na memória das
pessoas que ali frequentavam.
As histórias do Pirraça,
certamente, dariam para preencher um livro. Muitos fatos, muitas
pessoas, diversos
momentos bons. Eu, particularmente, tive o privilégio de
gozar da amizade dos
“Pirraças”. E, mais do que isso, tive a benção de me encontrar
com a minha “alma gêmea”, Lílian, depois de muitos anos
passados do fechamento do Pirraça. E, hoje, casados, temos essas
boas lembranças a compartilhar.
Se tivesse de dar um nome ao
livro, o chamaria de “Pirraça, o bar de Anápolis que
nunca fecha em nossos corações!”
Faltou contar a história da minha lente de contato rígida que caiu no meio daquela brita de mesma cor da lente. E o Ricardo, ainda namorado, bêbado, de gatão, procurando. Encontrou e sem nenhum arranhão. Coloquei de volta nos olhos e voltei a enxergar o colorido dos dias da nossa adolescência. Bons tempos, boas lembranças. Parabéns e obrigada pelo texto.
ResponderEliminarMorei em Anápolis de 1978 a 1990. Nesta praça me lembro do bar do João Taioba e do Isac(não se se a grafia é esta).
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