Estranho este título: o que Brasília, Kombi e frango têm em
comum? Aparentemente, nada! Aparentemente, porque a cidade, o carro e a ave
fazem parte de uma história da infância. E isso é uma riqueza que a gente
carrega pelo resto da vida.
Quando se é criança, não tem aventura melhor do que uma viagem
em família. E, para nós, era um grande dia quando tínhamos no roteiro uma ida a
Brasília, visitar os irmãos mais velhos que moravam na Capital Federal e
estudavam na UnB. A primeira coisa era dormir cedo, porque a viagem começaria
de madrugada e meu pai era corretíssimo no cumprimento do horário. Vamos sair
às 5 horas. Então, eram 5 horas, mesmo! Apesar da enrola da minha mãe. Porém,
tudo dava certo.
Família grande, carro grande. E a nossa condução na viagem
era uma Kombi, um veículo utilitário onde cabiam pelo menos umas 11 pessoas
sentadas (três na frente, com o motorista e oito distribuídos nos dois bancos
de trás). Nós, as crianças, gostávamos mesmo era de ir lá atrás, no bagageiro.
Mesmo com o barulho quase ensurdecedor do motor possante. Uma máquina:
velocidade máxima de 120 km/h. Lógico que não andávamos nem perto disso. Era,
no máximo, 80 km/h e olha lá. Nas subidas, dava vontade de sair para empurrar
ou, então, ir a pé que era mais rápido. Por isso, as viagens a Brasília, em
pista única na BR-153/060, eram longas e cansativas. Mais ou menos, umas quatro
horas para andar em torno de 130 km. E, às vezes, até um pouco mais quando
fazíamos paradas ou tinha de trocar um pneu furado.
Mas, tudo era festa. Passava Abadiânia; passava Alexânia e
logo estaríamos entrando no trecho temido, chamado de Sete Curvas. Eram sete
curvas, como descrito no nome, bem acentuadas. Na ida, uma grande subida e, na
volta, uma grande ladeira tortuosa, onde os acidentes eram muito frequentes.
Vários e vários relatos de mortes. E ali, talvez, era o pico da aventura da
viagem. A Kombi era lenta, o tráfego pesado. Era preciso, então, muito cuidado.
Mais algum tempo avistaríamos Brasília, a jovem Capital
Federal, com os traços arquitetônicos de Oscar Niemeyer. Estamos falando de
meados e final da década de 1970. A cidade foi inaugurada em 1961. Meus pais
presenciaram tudo desde o início e se emocionavam sempre quando chegávamos à
bela cidade, com os prédios dos ministérios, os imponentes palácios dos
poderes, a catedral. E, claro, o nosso local preferido, a torre de TV. Até
hoje, é empolgante a vista de Brasília daquele local. Nós, crianças, gostávamos
mesmo era do frio na barriga que dava estar num local alto. Mais alto do que
subiam as pipas dos vendedores desse artigo na feira que ficava próxima. Aliás,
uma feira bem grande com artesanato e comida. Mas não tínhamos esse luxo.
O ponto máximo ainda estava por vir: iríamos para a casa dos
irmãos, uma república de estudantes, mais ou menos arrumada para a nossa
chegada. Os móveis eram poucos, algumas camas de campanha (peça que, acredito,
já nem existe hoje); as mesas de estudo, enfim, um apartamento de estudante
mesmo, sem luxo. O que tanto aguardávamos era o almoço: frango assado.
Cheiroso, delicioso! Os olhos até brilhavam. Felicidade maior ainda, era ficar
com o pedaço da coxa com a pele bem assada. Não tinha nada melhor. Era tudo tão
simples, mas era isso que dava o tempero a tudo. Era o sabor daquelas viagens
inesquecíveis.
Depois da “mesa farta”, não podendo ficar muito tarde, fazíamos o
caminho de volta: Sete Curvas (de descida); Alexânia; Abadiânia; Anápolis,
nosso destino final. Chegávamos exaustos, no entanto, recompensados com aquele
domingo: o passeio de Kombi em Brasília e o banquete de frango. Quer melhor?
Comentários
Enviar um comentário